quinta-feira, 10 de agosto de 2006

além do norte de Portugal a terra chora e sofre...


Iniciamos o percuso Português que conduz a Compostela no dia 29 de Junho, uma repetição da experiência Jacobiana de 2004, com o acrescento dos 100 quilómetros que conduziriam a Finisterra e ao término da nossa aventura. Para quem já tinha feito o caminho, os primeiros dias foram uma constante repetição, pois choveu onde havia chovido, recebeu-se más noticias estas haviam chegado, sofreu-se onde já se havia sofrido, e houve jubilo e alegria onde esta já havia estado. Tudo muito igual, tudo muito parecido, até chegar-mos a 10km de Santiago de Compostela, onde pernoitamos no albergue que existe na localidade de Teo. Por volta das duas da tarde uma novidade anunciava-se no céu: negro e branco, maciço e imponente, assustador e mesmerizante, uma coluna de fumo prenunciava a destruição. Curiosidade, medo e apreensão...



Pouco depois outra coluna gémea se elevou... E não muito tempo passou sem que, ao longe, uma terceira massa de gases de combustão pintasse o céu. Três incêncios!!! No dia seguinte, pouco antes de chegar a Compostela encontramos as fumarolas, o mato e árvores mortas, o solo calcinado. Choramos pela terra queimada, mas sentimos alivio por julgarmos terminado o inferno. Ilusão, ingenuidade, ignorância. Dezenas de focos de incêndio devoravam a Galiza, e nessa tarde as chamas tentaram mesmo engolir a sua capital espiritual.



Durante os dias seguintes, quando caminhavamos o fumo acompanhava-nos, e o fogo apresentava-se sempre no horizonte, com mais ou menos distância, dependendo da nossa velocidade de caminhada, da direcção em que nós viravamos o olhar ou simplesmente do lado da colina em que nos encontrassemos.



Incansáveis lutaram os bombeiros, protecção civil, cidadão comum, em desespero e até à exaustão, numa luta desigual contra uma fome obscura que consome fauna, flora, esperanças, concretizações, sonhos e memórias agradáveis. Tudo cede e arde, no calor tudo se retorce e fica reduzido à negritude. A cicatriz fica gravada. As chagas da terra que voltarão a ser coberta pelo verde, mas nos corações e nos registos a devastação ficará recordada. Novamente um Prestige assolou a nossa bela península...

1 comentário:

S disse...

A quase todo o país se poderia atribuir esta descrição neste momento... Bela, verdadeira, triste.
Infelizmente, ano após ano repete-se o mesmo drama, as mesmas lágrimas, a mesma coragem de quem combate as chamas que devoram o nosso portugal, o nosso verde, as nossas casas, culturas, equipamentos, vidas até...
Quando nos bate à porta ou quando passamos por terras assim devastadas, é que vemos bem de perto aquilo que para muitos, com mais ou menos indiferença, apenas observam e comentam na TV. Aí sim, temos verdadeira noção da tragédia humana e florestal que surge ano após ano, verão após verão...