"Nós acreditamos, com efeito, que tu és «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado». Será que não existe uma tal natureza, uma vez que o «insensato disse no seu coração: Deus não existe»? Mas certamente este mesmo insensato, quando ouve isto que eu digo: «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado», compreende o que ouve, e o que ele compreende existe na sua inteligência, mesmo se ele não compreende que isso existe na realidade. Porque uma coisa é que certa realidade esteja no intelecto, outra é compreender que tal realidade existe. De facto, quando um pintor pensa antes o que vai fazer, ele tem na inteligência o que ainda não fez. Pelo contrário, quando verdadeiramente já o pintou, tem na inteligência o que já fez e compreende que isso existe. Mesmo o insensato está pois convicto de que «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado» existe pelo menos no intelecto: ele compreende-o quando o ouve, e tudo o que é compreendido existe no intelecto. Mas, sem dúvida, «aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado» não pode existir unicamente no intelecto. Se, na verdade, existe pelo menos no intelecto, pode pensar-se que também exista na realidade, o que é ser maior.

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Como tal, se «aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado» existe apenas no intelecto, então «aquilo mesmo maior do que o qual nada pode ser pensado», é algo maior do que algo que pode ser pensado. Ora, isto é claramente impossível. Existe pois, sem a menor dúvida, «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado», tanto no intelecto como na realidade.
(...) em todo o caso, é tão verdadeiro que nem se pode pensar que não exista. Porque pode-se pensar que exista alguma coisa, a qual não se possa pensar que não existe; o que é ser maior do que aquela que se pode pensar que não existe. Daí que, se se pode pensar que «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado» não existe, então aquilo mesmo «maior do que o qual nada pode ser pensado» não é «aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado»; o que pode não convir. Deste modo, «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado» existe tão verdadeiramente que não se pode pensar que não existe."
(...) em todo o caso, é tão verdadeiro que nem se pode pensar que não exista. Porque pode-se pensar que exista alguma coisa, a qual não se possa pensar que não existe; o que é ser maior do que aquela que se pode pensar que não existe. Daí que, se se pode pensar que «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado» não existe, então aquilo mesmo «maior do que o qual nada pode ser pensado» não é «aquilo maior do que o qual nada pode ser pensado»; o que pode não convir. Deste modo, «alguma coisa maior do que a qual nada pode ser pensado» existe tão verdadeiramente que não se pode pensar que não existe."
by S.A.